sábado, 30 de abril de 2011

Ernesto Sábato (1911 – 2011)

Para Silvia Carcomo e o grupo de alunos que estuda Sábato na UFRRJ


I

Minha amiga Silvia Carcomo comunica que acaba de ler, no jonal La Nación, a morte do escritor Ernesto Sábato. Amo os escritores latino-americanos. Mais do que Borges, Cortázar ou Aira, o escritor argentino Ernesto Sábato marcou a minha vida. Nenhum professor o indicou. Descobri a sua obra através das Páginas Amarelas da Revista Veja, final dos anos 70, no internato em Junidaí-RN. Tinha por volta dos 15 anos. Desde então, nunca esqueci deste autor que é doutor em física, e que trocou as certezas dos teoremas e da lógica pela busca das "verdades" existenciais e literárias. Tenho de cor, até hoje, alguns trechos desta entrevista que possui "Sigam os sonhadores" como título. Nunca vi um autor com tanta crença nas Letras. Nesta entrevista, Sábato fala da literatura como forma de ler a condição humana, e aciona o leitor de uma forma que pouca gente tem coragem de dizer: só devemos ler o que nos interessa, o que nos apaixona. Sábato diz também que ninguém é o mesmo após ler um autor como Kafka (foi aí que eu mergulhei na Carta ao Pai, e quase me afogo nesta prestação de contas afetivamente desfalcada).

II

Anos depois li outros textos do Sábato. Os que mais me marcaram não foram O Túnel e Sobre Heróis e Tumbas, dois dos seus romances mais recomendados pela crítica, mas O escritor e Seus Fantasmas, de 1963 . Esse foi, talvez, o primeiro livro barthesiano que li (antes de ler o próprio Roland Barthes). Fragmentado e fruído, repleto de intertextos com a literatura, a filosofia e outras artes, este texto mais indaga e sugere do que aponta respostas para as questões que o próprio título anuncia. Além disso, o autor nos envolve nos meandros tecnológicos e existenciais do universo literário, sugerindo filiações estéticas e literárias e acionando o desejo de outras leituras. Tendo o romance e a forma literária como temas recorrentes, o livro de Sábato enaltece principalmente o sonho, o indivíduo na sociedade e a arte. Embora seja permeado pelas noções de dualidades, de polaridades, e repleto de menções às idéia de profundidade, totalidade e universalidade - e as demais ilusões criadas pela modernidade do século XX -, este é sem dúvida um livro indispensável para quem transita pelo universo da criação e/ou se interessa pelo mundo das letras.

domingo, 24 de abril de 2011

Overdose do real

De olho nos autores que começaram a publicar a partir da década de 90 do século XX, no Brasil, percebe-se que com essa chamada geração realista surge uma outra forma de profissionalização literária. A partir do surgimento dessa geração 90 e tendo por base alguns textos lançados pela geração 00, podemos dizer que um outro perfil do autor literário passa a ser redefinido nestas primeiras décadas do século XXI.

Para a construção desse perfil autoral, a publicidade pode armar estratégias de inscrição cultural e de consolidação literária, diferindo de tudo o que foi visto no universo das Letras. Antenado com a subjetividade maquínica e virtual, esse novo perfil autoral possui muito pouco do autor que tinha na leitura e na escrita de textos verbais as bases do seu universo literário. Para alguns desses autores contemporâneos, literatura é outra coisa. Seus procedimentos estéticos e culturais são outros. Para eles, a literatura transformou-se em algo bastante diferente do que era, por exemplo, a arte literária para um escritor do século XIX – o mais literário de todos os séculos, como diz Eduardo Lourenço.

O perfil literário contemporâneo surge em sintonia com os gráficos da mídia e do mercado, mas de ouvido aberto ao discurso da crítica. Esse novo autor busca atender demandas múltiplas como as patrocinadas pelas feiras de livros e eventos culturais como as bienais, por exemplo. Daí, as agendas trepidantes e os infindos roteiros – reais e virtuais – da maioria desses autores. Eles elegem as letras urbanas e as ruas modernas como “personagens” de seus textos.

Esses textos são lidos, em sua maioria, por um viés realista। Esse realismo não tem nada a ver com aquele velho Realismo cheio de certezas e das noções de totalidade que aprendemos com Lukács. Não se trata de um realismo que acredita no poder supremo da representação. Mas nele faz falta, muitas vezes, uma imersão inventiva no universo imaginário onde os sonhos da razão não produzam apenas referente, mas principalmente letras.