terça-feira, 22 de dezembro de 2009

Um depois um








Texto escrito para o Curso “O Moderno e o Pós-Moderno”, ministrado pelo prof. David Jackson na Especialização em Literatura Brasileira na UFRN, Natal, 1991

Viagem estética e galática a bordo do fragmento "Um depois um" do livro Galáxias, de Haroldo de Campos

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I


Numa viagem pela linguagem Haroldo percorre no livro-poema Galáxias a pátria da página e nela instala fragmentos mentais de um discurso galático cujo ritmo e sonora idade determinam a vida paixão e morte da palavra morta apaixonada e viva, como quem esculpe a cara clara da página na folha da folha de relva da selva de pedra e palavra caras que nada valem neste vale tudo e sabem-se contidas ditas benditas mil vezes lidas para a lida como quem lida com a água líquida liquidando o ombro a mão o galão do galã guardião do signo aquático no parque mágico onde soam água puras cristalinas esverdeadas do poço do tanque do mar onde tudo é nada e o “mito é o nada que é tudo”

II

Tudos traz Arnaldo Antunes num texto que diz de um outro e outro mais Um Depois Um como outros fragmentos galáticos apresenta em seus traços em suas palavras a ponte para a grande viagem sem volta nem fim como livro e este como viagem que se desfaz desescreve e espera

III

Feito Godot na eterna espera do nada um grupo de jovens – 5 ou 6 dependendo do ritmo da leitura – numa estação de trem alemã celebra o nada – inimigo da conduta moral planetária – prenunciado nas massas marrons mascadas chupadas enquanto chega a polícia cobrando identificação de quem perdeu a noção de unidade totalidade identidade

IV

Em cenários nos quais as relações de espaço determinam conexões com o poder, os jovens são eternos viajantes atores em cenas de encontros e despedidas num tempo onde “há tempos são os jovens que adoecem” e o gado pasta o nada e a perda produz encontro.

V

Caracterizado como “esquizoide e permeável a tudo” (Sérgio Paulo Rouanet), o homem pós-moderno substituiu a justificativa estética da vida (característica do Modernismo) pela justificativa pulsional. Na construção do texto passam a valer os processos textuais que se sobrepõem aos níveis estético e temático.

VI

A palavra e o significante são os grandes personagens do texto onde a escrita é o corpo.

VII

Seguidor da vertente oswaldiana de modalidade cultural, Haroldo transcria Homero, Dante, Mallarmé, Goethe, Mayakovski e compõe um texto marcado pela proliferação de imagens, re-produções, recortes, fabricando um escrita que se vê, olha a si própria, possibilita uma leitura plural, uma plurileitura onde a fala descãimbra e a narrativa desnarra, deságua numa galáxia sonora que só se reconhece como ritmo, forma, significante...