Entrevista de Katy Navarro e Sandra Ney com Nonato Gurgel para o PROLER – Casa da Leitura, Rio de Janeiro, 2010.
1) Qual o Curso que ministrou e qual foi a receptividade dos participantes?
R: Ministrei o curso “Floração da Prosa no Sertão” (27/07 a 14/09). A receptividade foi boa, como atestam 40 fichas de inscrição e as listas de presença.
2) Qual o perfil dos participantes?
R: Gostei muito do perfil dos participantes. Principalmente pela diversidade da faixa etária – de 18 a 60 anos –, como também pela multiplicidade dos perfis profissionais. Havia no curso professor, coordenador de curso, aluno de mestrado, pesquisador do IBGE, produtor cultural, além de graduandos dos cursos de Letras e História, escritor.
3) Qual a importância da realização de cursos como o seu na formação dos profissionais de educação e mediadores de leitura?
R: O curso empreende uma leitura da prosa moderna produzida no Brasil do século XX, e dos seus narradores mais representativos. Através dessa leitura, amplia-se o potencial de interpretação daqueles autores considerados intérpretes do Brasil, como Euclides da Cunha e Gilberto Freyre, dentre outros. Além disso, o curso possibilitou um maior entrosamento entre profissionais e alunos da Baixada Fluminense, principalmente de Nova Iguaçu, São João do Meriti e Mesquita, com alunos e profissionais do Rio de Janeiro.
4) Como vê o Programa de Incentivo à Leitura, o PROLER?
R: Acho o PROLER um programa da maior importância para um país como o Brasil que possui um pequeno público leitor. Os cursos da Casa da Leitura evidenciam a prática da leitura como atividade política, na medida em que reúne profissionais e cidadãos dos mais variados extratos sociais, estabelecendo trocas, parcerias, e dilatando as possibilidades culturais.
5) Qual a diferença que a leitura faz na vida do indivíduo?
R: A leitura é uma ação. Ela auxilia na construção do discurso e o discurso engendra a identidade, a cidadania. Através da leitura, o sujeito torna-se um doador de sentidos. A leitura amplia a visão contextual, remove obstáculos existenciais. A leitura pode ser também – por que não? – terapêutica.
6) Como incentivar a leitura nas crianças nessa era de mídia digital?
R: Vejo as mídias digitais como suportes que intensificam as possibilidades de leitura e produção de textos. Cabe aos pais e educadores estabeleceram metas e propostas que incluam as leituras impressas e virtuais na formação das crianças.
7) O que a leitura acrescentou na sua vida?
R: A leitura não acrescentou. Ela fundamentou a minha existência como homem e cidadão. Sem a leitura, não haveria isso que as pessoas chamam “projeto de vida” ou “minha vida”. Fui salvo pelos livros. Autores e personagens foram os meus heróis desde a infância.
8) Cite os autores mais lidos por você.
R: Euclides da Cunha, Graciliano Ramos, Gilberto Freyre, Guimarães Rosa, João Cabral de Melo Neto, Ana Cristina Cesar, Jorge Luís Borges, Cesar Aira, Enrique Vila-Matas, Roland Barthes e Walter Benjamin.
9) Se puder escreva um pequeno trecho de um texto de autor que tenha marcado sua vida.
R: O seguinte trecho foi transcrito do livro “Os Sertões”, de Euclides da Cunha.
"O sertanejo é, antes de tudo, um forte. Não tem o raquitismo exaustivo dos mestiços neurastênicos do litoral.
A sua aparência, entretanto, ao primeiro lance de vista, revela o contrário. (...)
É desgracioso, desengonçado, torto. Hércules-Quasímodo, reflete no aspecto a fealdade típica dos fracos. (...)
É o homem permanentemente fatigado.
Reflete a preguiça invencível, a atonia muscular perene, em tudo (...).
Entretanto, toda esta aparência de cansaço ilude.
Nada é mais surpreendedor do que vê-la desaparecer de improviso. Naquela organização combalida operam-se, em segundos, transmutações completas. (...)