Assim como o sonho e o eterno retorno, o tema do duplo é também um dos procedimentos estéticos mais recorrentes nos enunciados fantásticos. Borges faz uso desse tema em toda a sua poética. Essa consciência do duplo faz-se presente no conto “As ruínas circulares”.
Neste conto do volume Ficções, o sonhador vê a cada sonho a construção do outro a que se propõe sonhar. Diz o narrador: “Percebia-o, vivia-o, de muitas distâncias e ângulos”. Como sabemos, no final da narrativa o sonhador compreende “que ele também era uma aparência que outro o estava sonhando”. Era, portanto, o duplo de outro atemporal e anterior a ele.
Tamanha consciência do outro, possibilitou a Borges o exercício de vários textos relacionados à temática do duplo. Dentre essas narrativas destacam-se “Borges e eu”, “A Outra Morte” e “Sur” como textos que nos quais acontece essa representação do duplo. As semelhanças físicas, os processos telepáticos e a possibilidade de desdobramento do eu destacam-se como formas visíveis dessa representação.
Eu é um outro, diz a lição de Rimbaud। Essa possibilidade de um eu desdobrar-se em outro é a forma utilizada pelo autor de “As ruínas circulares”. Como vimos, o homem vindo do sul teria que sonhar um outro e “impô-lo à realidade”. Ele compartilha essa empresa com o Deus Fogo e sonha um homem “pensado entranha por entranha”.